sexta-feira, 23 de março de 2007

O nosso Inquérito: António Vasco Salgado.


Nome: António Vasco Salgado.
Cozinha muito frequentemente? Se pudesse todos os dias. Ao fim-de-semana a cozinha é o meu local quase exclusivo de perdição.
Para quem? Família e amigos.
Quando começou a cozinhar? Na adolescência por brincadeira. Na vida adulta por sobrevivência.
Seguiu algum curso? Não propriamente, apenas algumas aulas temáticas na Cozinhomania. Tenho ultimamente assistido a alguns congressos, como o Madrid Fusion e o Mejor de la Gastronomia. Sou contudo, fundamentalmente um autodidacta.
Há alguém que considere seu mestre? Não um, mas dois. Martin Berassategui e Juan Roca. O primeiro pela imaginação prodigiosa, o segundo por uma obra teórica absolutamente notável.
Livros de cozinha favoritos: Aí está uma pergunta difícil para quem tem uma biblioteca temática com mais de 300 referências.
Qual é o prato que mais gosta de cozinhar? Em geral, aquele que é tecnicamente mais difícil, mas que também, mais gozo dá. Estou a pensar na alta pastelaria francesa de Pierre Hermé ou na catalã de Paco Torreblanca.
O que cozinha mais frequentemente? O produto da época.
Costuma aproveitar os restos de um prato que cozinhou e com eles fazer um novo prato? Nunca. Contudo, os temperos, sobretudo quando se trata de molhos, com frequência.
Tem um produto favorito? O limão pelo seu perfume.
Que tempero considera mais importante? Não sei se o mais importante, mas talvez o mais sensual, a pimenta moída de fresco.
Tempero mais excessivamente valorizado? Todo aquele que não presta.
Tempero mais injustamente esquecido? A baunilha de vagem, de preferência de Madagáscar ou do Tahiti.
Utensílio de cozinha mais indispensável? Uma faca japonesa topo de gama.
Tem um utensílio que considere “pessoal” ou “favorito”? À falta de inspiração talvez aquele que causa geralmente mais sensação, no caso o maçarico.
Interessa-se pela aplicação de novas tecnologias na cozinha? Absolutamente. A cozinha do vácuo é verdadeiramente estonteante.
Costuma consultar sites da internet dedicados a temas culinários? Com frequência.
Quais são os seus sites favoritos? Lo mejor de la gastronomia, A fuego lento, Derecoquinaria, Cocineros Info, Librairie Gourmande, Pure Gourmandise, Le Meilleur du Chef, Pierre Gagnaire, só para citar alguns.
Quais são as suas lojas favoritas para produtos alimentares e equipamento de cozinha? Dehillerin e Mora em Paris, Coccineros Info em Madrid, William-Sonoma em Nova Iorque e sobretudo em São Francisco.
Prato favorito? A última novidade que até eu achei que saiu muito conseguida. No caso, leitão marinado com mostarda de Dijon cozido a baixa temperatura em bolsa de vácuo, durante 26 horas, acompanhado de favas sem casca cozidas ao vapor durante 3 minutos. A receita é baseada na do livro de Massimiliano e Raffaele Alajmo, Ingredienti. O livro é caro, mas parte do custo reverte a favor da Associação Italiana de Luta contra a Leucemia.
E petisco? Dos últimos que experimentei, gostei das sardinhas marinadas 24 horas em vinagre e água do mar.
Prato português favorito? Aqui sou mais tradicional, mas também pelo que se refere em baixo, pastéis de bacalhau com arroz de grelos.
Restaurante favorito? Martin Berassategui em Lasarte, Pierre Gagnaire em Paris e Tetsuya Wakuda em Sidney.
Conselhos ou normas de sabedoria? Para se atingir a perfeição culinária deve-se respeitar o produto e ter uma atitude obsessiva e científica pela técnica, sobretudo os tempos de cozedura.
Há alguma pergunta que gostaria que lhe fizéssemos? Porque é que a gastronomia não há meio de avançar? A minha resposta: tem pouca curiosidade e espiríto de inovação, em síntese, muito reaccionária. Veja-se aquele que continua a ser o esplendor da culinária familiar lusitana, pelo menos nos últimos 30 anos, o bacalhau com natas.

Uma das suas receitas favoritas:
O meu bacalhau com broa de milho
Rodelas redondas de broa de milho, com diâmetro idêntico às dimensões dos lombos de bacalhau fresco, tostadas de preferência em prensa eléctrica. Uma das boas broas de milho que se vende em Lisboa é a padaria da praça de Campo de Ourique.
Lombos de bacalhau fresco limpo que se encontra à venda no supermercado do El Corte Inglês, colocados em bolsas de vácuo com azeite perfumado com essência de fumo. Colocar as bolsas em banho-maria a 60 graus durante 20 minutos.
Cortar na fiambreira lâminas de 1,5 mm de chouriço de porco preto de primeira qualidade. Triturar com a varinha mágica uma boa mão cheia de coentros com azeite de primeira qualidade. Sugiro Ourogal ou Monte da Ravasqueira.
Montagem: colocar no fundo do prato a tosta da broa de milho. Colocar sobre esta, as fatias de porco dispostas em rosácea. Por cima, colocar o lombo do bacalhau fresco e por cima deste uma colher de sopa de azeite com coentros. Decore com algumas folhas de espinafres crúas, verdes ou vermelhas.

Uma receita de “restos”:
Limão confit.
O que sobrar aproveite, corte ao meio ponha dentro de recipiente estanque para compota com sal grosso, sumo de limão e azeite. Deixe no frigorífico durante 1 mês. Utilize para tempero. Uma delícia.

Porque a gastronomia é cultura, não perca a exposição da BESFOTO no CCB e um dos melhores filmes em exibição em Lisboa, A Vida dos Outros. Tão triste quanto belo. Saudações gastronómicas!