I had a Dream. Crónica baseado no discurso de Martin Luther King. Lincoln Memorial, Washington DC. Agosto, 28 de 1963.
Tendo os meus dois filhos pequenos nascido nos últimos dez anos, tiveram oportunidade de assistir á construção do modelo teórico e prático que eu utilizo no meu “approach” á culinária. Termos como pacojet, roner, cozinhar no vácuo, já fazem parte do léxico deles.Ambos já participam, cada um á sua maneira. Ela mais velha entra habitualmente na preparação da massa para as tartes, embora passe a vida a insistir que até uma massa têm de descansar, bem como na decoração dos pratos. Sempre que tem uma amiga que pela primeira vez vai lá a casa, ao mostrá-la, pára invariavelmente em frente das estantes onde de forma orgulhosa tem o seguinte discurso "...e aqui estão os livros de cozinha do meu pai". Ele, embora ainda não totalmente liberto do complexo de Édipo, lá vai copiando pouco a pouco, os comportamentos paternos e dizendo para quem o queira ouvir, que quando for grande quer ser cozinheiro e maestro, insistindo em pronunciar este último em escorreito italiano. Não é por ser meu filho, mas para quem queira verdadeiramente ser chefe, não encontro melhor associação.Foi assim que me surgiu a seguinte ideia. Sabendo o que sei hoje, como seria o meu restaurante ideal. O mesmo apareceu-me em sonho.Comecemos pelo nome. A Internacional. Porquê? Porque embora esteja de acordo com a ideia que a grande cozinha tem dois berços, a bacia do Mediterrâneo e o Oriente, opinião que me foi expressa por um françês, que conheci quando de férias no Brasil, com um impressionante currículo de 11 visitas ao restaurante de Pierre Gagnaire, não deixo de achar que também é algo redutora.Ignorar influências de culturas gastronómicas, tão diversas como as que nos chegam de países, em principio tão improváveis nestas matérias, como o Brasil, o Peru os EUA, Austrália e Africa do Sul, é no mínimo imprudente.A Internacional teria à entrada um enorme retrato de Ho chi Min. Por duas razões, por ter sido um comunista ilustre, quer se goste ou não, lutador incansável pela independência do Vietname e cujo nome casa bem com o do restaurante. Finalmente, por ter chegado á distinta posição de saucier, no famoso restaurante do Hotel Ritz sob a batuta do Chef Auguste Escofier. Não estou totalmente confiante nesta última história, que é referida num dos livros de Anthony Bourdain, mas que interessa se serve os propósitos desta minha crónica. Para quem não saiba, Ho Chi Min, chegou a Paris por volta dos anos vinte e foi aí que se iniciou nos círculos comunistas europeus, nomeadamente franceses, tendo sido um dos fundadores do PCF. Por outro, a Auguste Escofier é-lhe atribuída a concepção da chamada brigade das cozinhas dos grandes restaurantes. Na brigade o Chefe é o chefe, há habitualmente um elemento que se responsabiliza pelas carnes, outro pelos peixes e por aí adiante. Uma dos elementos em destaque é exactamente o saucier, que como o nome indica é responsável pela preparação dos molhos. Grandes sauciers deram chefes lendários, um deles Alain Senderens, autor entre outros de uma receita de pato, que a minha amiga Lena, lembra com manifesta saudade e que constitui um dos maiores desafios gastronómicos que alguma vez tive pela frente, o chamado pato apicius de Alain Senderens. Um dia conto!Os copos inevitavelmente seriam Riedel, obedecendo a sua utilização, á escolha criteriosa do vinho.A loiça seria da marca catalã, Pordamsa ou da basca, Bidasoa. Não só são de um design magnífico, mas também por terem formas diferentes, permitem uma escolha de acordo com aquilo que vai á mesa. Eu sigo o seguinte princípio, prato seja ele qual for, carne, peixe ou sobremesa, desde que tenha um componente importante de molho serve-se em prato com fundo, vulgo de sopa. Pratos com pouco ou nenhum molho, em pratos rasos. Se faz sentido a lógica que um vinho da Borgonha não deve ser bebido num copo para um Bordéus, defendo que a loiça deva ser ajustada em função do prato que se confecciona, independentemente do aspecto estético final. Facas, nomeadamente, para comer caça, só conheço umas, as Laguiole , de Aubrac em França.Na parede e na impossibilidade de exibir as telas gigantes, que Mark Rothko inicialmente concebeu para um restaurante em Londres, e que hoje em dia, ocupam a totalidade de uma sala da Tate Modern, exibiria artistas contemporâneos portugueses.Por fim e á laia de bónus, sempre que algum dos comensais fizesse anos, passaria os parabéns a você com música do hino dos trabalhadores, a Internacional, cuja gravação teria encomendado a um grupo coral alentejano. Nesse dia e apenas para a mesa do feliz aniversariante, o vodka seria por conta da casa.Sonhos e fantasias!
As madeleines do meu restaurante, A Internacional. A ideia é servi-las ao café.
Derreta 150 g. de manteiga até ficar noisette. Misture 40 g de açucar, com 45 gr de farinha e 120 g de avelãs moídas. Bata 4 claras em castelo e junte á mistura açúcar-farinha-avelã. Finalmente junte a manteiga.
Vai a repousar no frigorífico pelo menos 1 hora.
Distribua pelas formas e leve ao forno, durante 20 minutos a 180 graus.
quarta-feira, 28 de março de 2007
Escrevem-nos: António Vasco Salgado
Publicada por
Teresa Cota Dias, Manuel Murteira Martins e José Vilela
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quarta-feira, março 28, 2007
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